Durante a minha infância, vivi de maneira arredia. Tudo me causava estranhamento e incômodo. Não sabia ao certo para onde deveria olhar, pois não havia nada que chamasse a minha atenção verdadeira e profundamente.

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Não encontrei o pouso nas leituras dos gibis e livros, como se aconselharam. Até então o que mais me entusiasmava eram os jogos eletrônicos de aventura. Em cada história narrada havia uma conjunção de detalhes que compunham a atmosfera (os objetos, a energia das pessoas, a iluminação do local etc), assim como no Cinema. Mas nos jogos havia uma maior interação, como se fosse possível incorporar no personagem, de acordo com as possibilidades e limitações construídas pelo desenvolvedor do jogo.

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Recebia as sensações dos jogos e vivia com elas dentro de mim sem saber como passá-las para fora de mim. Foi, então, que recebi de meu pai uma nova forma de jogo, onde desta vez eu seria o desenvolvedor: um CD de música clássica. Sim, esse CD me revelou o que seria a semente dos Diálogos Criadores. A partir daquele CD, pude desenvolver a escrita de meu primeiro romance. Aquela música gerou dentro de mim um espaço, base essencial para que canalizasse as energias que habitavam em meu interior. Meu pai, sem perceber, comunicou o que eu precisava tanto ouvir. 

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Chamei mais tarde esses encontros com a vida como "a arte de encontros ativadores", ou seja, encontros que ativavam um espaço essencial em mim, que me colocavam na posição de desenvolvedor, isto é, intérprete e tradutor do que a vida me comunicava a todos instante.

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Assim  surgiram os livros "A colheita dos grãos: odes sonoras" (ed. Kotter), construído a partir das músicas; "A provação da luz", a partir de filmes;"A prensa e o vinho", a partir de refeições. (Estes dois últimos ainda não publicados.)

Mas não me contentei em escrever livros. Comecei a manifestar um genuíno interesse em querer saber sobre como outras pessoas desenvolviam seus "encontros ativadores". Em 2016, enquanto atuei como cineclubista em Lumiar (RJ), criei um espaço de interlocução com o público, através do jornal de circulação local Cinescópio. Nesse jornal, convidei pessoas a escrever afetivamente a partir de filmes que elas mesmas escolhiam. Era meu intuito que pudessem também criar a partir do que já foi criado, ainda que às custas da narrativa original construída pelo desenvolvedor do filme.

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Percebi que o papel do outro na tecitura de um diálogo a dois é fundamental nesse processo de movimentação e renovação do que se fincou em nossa memória, fruto de nossos envolvimentos. E que gerar esse tipo de diálogo a dois nos lança na direção do desenvolvimento de um espaço vivo, orgânico. Assim são com as correspondências.

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Desenvolver uma interlocução com o que vai além da própria obra ou alguém, numa escuta empática e artística, num gesto comunicativo e re-criativo da realidade. Foi essa a linguagem que meu coração buscou encontrar há tanto tempo, na escuta de que compomos para pôr em diálogo com o que nos cerca.  

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Assim são os Diálogos Criadores. E então? Vamos juntos dialogar?

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